O
Expansionismo Marítimo e Comercial da Europa
As Grandes
Navegações dos séculos XV e XVI
O
expansionismo ultramarino europeu deve ser entendido como um movimento inserido
na Transição do Feudalismo para o Capitalismo. Outro aspecto a ser abordado
aqui é o fato de a expansão ter sido realizada para superar as dificuldades
enfrentadas pela Europa desde o século XIV, tais como:
- a crise
monetária decorrente da escassez de metais preciosos para a cunhagem de moedas,
causando riscos para a circulação de mercadorias;
-
as dificuldades para a obtenção das especiarias, ou seja, diversos
produtos da culinária, da medicina tradicional e da ourivesaria, entre outros
oriundos da região das Índias Orientais e que eram monopolizados pelos
comerciantes italianos, que os compravam nos portos do Mediterrâneo Oriental
dos mercadores árabes. Essa situação concorria para uma elevação frequente dos
preços cobrados no mercado europeu.
De
modo que o expansionismo marítimo e comercial tornou-se imperativo para: o
enfrentamento dos problemas econômicos; para proporcionar o fortalecimento do
Estado; para permitir a acumulação de riqueza nas mãos do grupo
mercantil.
(...) Os reis precisavam de muito poder para governar a tudo e a todos. Esse
poder precisava ser sustentado pelas riquezas: não era possível ser forte sem
ser rico. Os reis se interessaram pelos negócios dos comerciantes e se
associaram a eles. Em troca os comerciantes financiaram as principais
despesas do reino.
Ao se
iniciar o século XV, a Europa possuía uma série de conhecimentos básicos para
realizar as grandes navegações: “Navegar é preciso”, como diria bem mais
tarde o poeta Fernando Pessoa. Em condições melhores, Portugal e Espanha se
sobressaíram na aventura marítima. Num período de cem anos, portugueses e
espanhóis contornaram a África, atingiram a Ásia, descobriram a América e a
Oceania e deram a volta ao mundo, numa das experiências mais empolgantes de
todos os tempos (...)
[AMADO,
J. & GARCIA. L.F. Navegar é preciso. Grandes descobrimentos marítimos
europeus. Atual. 6ª edição. 1991. p.7]
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Não
obstante o fato de o expansionismo ser visto como uma superação de
dificuldades, devem ser destacados a influência de outros fatores
nesse processo como:
- a
aliança entre o Estado e a burguesia: os Estados recém formados engajaram-se na
expansão a medida que precisavam captar recursos para fazerem frente as suas
despesas de funcionamento. De modo que protegido pelo Estado, o capital burguês
pode ser investido na expansão ultramarina;
- o
desenvolvimento técnico-científico: como a expansão se fez pelo Atlântico,
cujas condições de navegabilidade não eram tranquilas e havia sobre o Oceano
lendas e mitos que amedrontavam os europeus, isto tornou necessária a precisão
dos equipamentos alcançada pela criação das caravelas, pelo aperfeiçoamento da
bússola e do astrolábio, pelo desenvolvimento do quadrante e da cartografia
esta, apoiada no avanço da astronomia;
- o
espírito religioso: ainda que reconhecendo a motivação econômica do
expansionismo, algumas publicações da época fazem referência a restauração do
espírito cruzadista nas Grandes Navegações, ou seja, elas incluíram entre seus
propósitos a expansão do cristianismo.
O
pioneirismo português nas navegações do século XV
Ainda que a expansão fosse do interesse da Europa,
coube ao pequenino Estado de Portugal atuar como pioneiro nesse processo. Essa
primazia deveu-se a uma combinação de situações:
- a
formação do Estado no século XIII sob a liderança de Henrique de Borgonha e a
aliança firmada entre a dinastia de Borgonha e o grupo mercantil, que resultou
na criação de leis de proteção do capital e de incentivo ao comércio e a
construção naval;
- o
desenvolvimento da técnica de navegação alcançada pelos portugueses em centros
de estudos como se constituiu a Escola de Sagres fundada pelo Infante D.
Henrique;
- a
posição geográfica, que tornou Portugal um ponto comercial de transição do
Mediterrâneo para o Atlântico Norte. Daí o comércio adquirir tradição entre os
portugueses, manifestar-se o interesse do Estado em impulsioná-lo e a aquisição
de conhecimentos nos contratos com navegadores e comerciantes do Norte da
Europa como os batavos.
O périplo
português da África
Com relação a trajetória portuguesa em direção às
Índias Orientais, região alvo do projeto expansionista, que visava alcançar a
região das especiarias- se fez através do périplo africano em nome da segurança
- não nos esqueçamos dos medos em relação ao Atlântico – e da exploração do
continente negro, cujos recursos retirados e comerciados, com a instalação de
feitorias no litoral, financiariam a própria empresa expansionista.
Cronologicamente o expansionismo lusitano
começou em 1415 com a conquista de Ceuta no Norte da África, avançou com as
feitorias na costa ocidental, ultrapassou em 1487/88 com Bartolomeu Dias o Cabo
da Boa Esperança e atingiu seu ápice em 1498 com Vasco da Gama alcançando a
cidade de Calicute.
A chegada dos portugueses às Índias foi
precedida pela assinatura, com o Estado Espanhol, do Tratado de Tordesilhas em
1494, que dividiu entre eles as terras conquistadas e aquelas ainda a serem
alcançadas.
As conquistas portuguesas produziram um
considerável conjunto de mudanças como a troca do eixo comercial do
Mediterrâneo para o Atlântico o que decretou o declínio comercial das cidades
italianas e a formação de um império colonial tricontinental.
“E aproximava-se o tempo
da chegada das notícias de Portugal sobre a vinda das suas caravelas, e
esperava-se essa notícia com muito medo e apreensão; e por causa disso não
havia transações, nem de um ducado... Na feira alemã de Veneza não muitos
negócios.”
[Diário
de um mercador Veneziano, 1508]
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“Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor
Deus ao mar o perigo e o abismo deu
Mas nele é que espelhou o céu.”
[Pessoa, Fernando. Mar português]
Esse poema de Fernando Pessoa se refere à
conquista dos mares pelos portugueses no início da era moderna, cujos
resultados ficaram conhecidos como as Grandes Navegações.
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A
expansão espanhola
Após
superarem seus problemas internos como a formação do Estado Nacional e a
retomada do controle político das áreas, até então controladas pelos mouros,
obtida na Guerra de Reconquista finalizada em 1492 com a conquista de Granada.
Entretanto, como os espanhóis estavam
atrasados em relação aos portugueses e, em razão disso, não poderiam usar a
rota do Atlântico, se viram na contingência de investir na proposta do
controverso navegador genovês Cristóvão Colombo de navegar em direção ao
Ocidente com base na esfericidade da Terra.
A viagem de Colombo resultou na
“descoberta” da América, embora o comandante da expedição não tivesse exata
noção da região que alcançara. Convencido que havia chegado às Índias, Colombo
não titubeou em denominar seus habitantes de índios. A celebração do Tratado de
Tordesilhas em 1494, momentaneamente pôs termo a divergência que surgira entre
os reinos ibéricos e abriu caminho para que nos anos posteriores através da
ação dos Adelantados, o Estado Espanhol promovesse a conquista das regiões da
América continental com as expedições de Vasco Nunes Balboa em 1513, de Hernán
Cortêz em 1521 e de Francisco Pizarro/Diego de Almagro em 1532 cujos resultados
mais significativos foram as conquistas do Peru e do México por Cortêz e Pizarro
respectivamente.
Com relação ao expansionismo espanhol os
resultados mais significativos foram: a localização das ricas reservas de ouro
e prata que enriqueceram o Estado, o processo de “genocídio” que matou, em 100
anos, cerca de 50 milhões de ameríndios e a comprovação da esfericidade da
Terra com a viagem de Fernão de Magalhães de 1519/1521.
Os
efeitos da expansão ibérica
Foram
inúmeros e notáveis os efeitos nos campos econômico, político e social. Dessa
expansão ibérica para Europa e porque não dizer para o mundo, como exemplo
temos:
- a
transferência do eixo comercial do Mediterrâneo para o Atlântico;
- a
decadência comercial das cidades italianas superadas pelas cidades ibéricas;
- a
ampliação das rotas comerciais e dos mercados que adquiriram dimensão mundial;
- o
fortalecimento do Estado e da burguesia graças a riqueza acumulada pela
expansão;
- a
conquista de novos territórios e início do processo colonizador da América;
- a alta
geral dos preços na Europa decorrente da chegada de um gigantesco volume de
metais preciosos extraídos da América pela Espanha. Essa situação teve uma
dimensão de tal ordem que foi denominada de Revolução de Preços.
“Por boas razões é este período da
História chamado de Revolução Comercial. O comércio que, crescia
paulatinamente, passou a dar passos gigantescos. Não só o velho mundo da
Europa e regiões da Ásia se abriram aos comerciantes empreendedores, mas
também os novos mundos da América e África.
Não mais se limitava o
comércio aos rios e mares bloqueados por terras, como o Mediterrâneo e o
Báltico. Se, anteriormente, o termo comércio internacional queria apenas
dizer comércio europeu com uma parte da Ásia, agora a expressão se aplicava a
uma área muito mais extensa, abrangendo quatro continentes, tendo rotas
marítimas como estrada (…) a expansão dos mercados, nessa época, foi maior do
que nunca. Novas regiões com que comerciar, novos mercados para os produtos
de todos os países, novas mercadorias a trazer de volta.”
[HUBERMAN, Leo. História da Riqueza do homem. Rio
de janeiro, Guanabara. 1986. p.99]
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As tentativas inglesas e francesas de expansão
No
século XVI, houve ainda algumas tentativas de expansão por parte dos ingleses
e dos franceses. Entretanto, fica claro que não passaram de atividades
particulares, algumas de caráter pirático sobre as possessões ibéricas na
América. Efetivamente a expansão desses povos se deu no século XVII, a partir
da participação do Estado no processo.
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